28.3.13

Meu amor



Não leves tão a sério as coisas que escrevo
Ou tudo que falo

A história conta muito
É claro

Os sentimentos também
E a eles sou grato

Mas a imaginação é o segredo
E preciso que aceites este fato

27.3.13

Não lance teus segredos no ar



Mesmo que estejas só
Num longínquo lugar
E sobre o teu rosto
Sopre apenas a brisa do mar

Palavras viajam
Sentimentos brilham

E é bom que saibas
Que o vento tenta
Mas não consegue
Manter por muito tempo
Diamantes a voar

26.3.13

Há muito deixei de ser santo



Minha auréola arrancaste
Mas não a desprezei

Com ela emoldurei teu retrato
E na parede o preguei

Iluminando a cabeceira da cama
Em nosso quarto

25.3.13

10 metros acima da água



Uma plataforma
Um salto

E no vazio
O corpo desaba

No tempo em que o tempo para
Nada abala o momento

Não há expectativa
Não há sofrimento

A eternidade
Está provada

22.3.13

Uma camisa



Abraça outra camisa
E atenua a indiscrição do abajour

Os corpos se enrolam
E atiram o frio pela janela

As horas galopam furiosas apressadas
E nem todos os vazios são preenchidos

O imperioso dia interrompe as falas
Com sua luz causticante e inoportuna

21.3.13

Me agradaria ser



A luz que te inspira
Mas não a que determina

A que identifica caminhos e mostra
Não a que pesa em tuas costas

O vento que te ajuda a voar
Torce para que seja alto e livre

E que lá de cima
Ao escolheres a rota

Com tua vida sigas
Armada de todas as perguntas

Sem te importares se haverá atalhos
Fim de jornada ou respostas

20.3.13

Uma pessoa


É uma pessoa só
Mas não é uma só pessoa

A que fica
Nem sempre é a que mais quer ficar

A que cala
Às vezes não é a que fala

A que ousa ser
Pode esconder a que não impõe seu querer

A que na hora do encontro vibra
Não quer ser a que chora na despedida

19.3.13

Nós e os nós



Cegos
Muitos
Atados há muito

Cabos de guerra
Longos
Pesados

Erros do passado
Vivos
Sepultados

Membros que se arrancados
Se tornarão sobras inúteis
Pedaços danificados

É preciso ficar a sós
Juntar vontades
Desatar todos os nós

E voar
Sós
Nós

18.3.13

Amor



Possível ilusão

Ainda vive a estrela
Cuja luz atinge meus olhos
Nesta noite de verão?

15.3.13

Numa relação



Não há quem não viveu
A dúvida
E teve que optar
Entre ser feliz
Ou ter razão

14.3.13

Que seja este mais um de nossos inúmeros segredos



Catalogado
Com método

Acomodado na estante
Com critério

Juntado ao acervo
Por assunto

Só a nós acessível
A todos os demais invisível

E pronto para ser consultado
A qualquer instante

13.3.13

Leia-me meu bem



Preciso que leias
Os textos que trago no corpo
E os que no teu corpo escrevo também

Leia-me devagar
De trás para frente
De frente para trás

De baixo para cima
De cima para baixo
Cruzado

Leia-me lentamente
Rápido
Ou indo e voltando simplemente

A plenos pulmões gritando
Pensando em silêncio
Ou ao pé do ouvido sussurrando

Me empurrando pro lado
Me puxando de volta
Ao mesmo tempo querendo e rejeitando

Leia-me meu bem
Com o ardor de quem honra quem escreve
Pois sabe que é obra do amor

Amor que não se cala com silenciar da boca
Com o aquietar dos quadris
Mantendo-se às vísceras atado

Que não se esgota ao secar da pele
Mantendo o abraço
Mesmo com o baixar da febre

Memorize cada palavra
Cada gozo em urros declamado
Versos escritos com ferro em brasa

Leia-me e não deixe que este precioso alfarrábio
Desabe no abismo do esquecimento
E se perca neste infinito vácuo

12.3.13

Se acaso hoje eu morrer



Por este fato menor
Não se deixe abater

É que depois desta noite
Se vivo ou morto
Não importa mais saber

Desde que nem tudo se apague
Desde que reste ao menos saudade

11.3.13

Amor com amor se paga



Sólida palavra
Com verdade lastreada

Moeda efetiva
No passado cunhada

Única capaz de quitar uma dívida
Assumida e declarada

8.3.13

É preciso estar atento



Redobrar carinho e cuidados
Mais ainda neste momento
Em que nossos corpos já não são mais os mesmos
E que o peso dos anos
Faz crescer em nós o receio
De não sermos mais tão interessantes

Receio de que as décadas
Tenham remodelado o amor
Engessado os encantamentos
Tornado maiores nossas pequenas diferenças
Possam ter feito parecer ruim
O fato de sermos menos arrebatadores
Quase nada espertos
Menos resilientes
Menos espirituosos
Quase nada surpreendentes

Conhecemos melhor nossos limites
Nossas almas e mentes
Sentados todos os dias frente à frente
Nos vemos apenas como somos
Humanos
Mas ainda desejosos um do outro
Reciprocamente dependentes

Precisamos
Renovar as cores desse amor maduro
Pintar paredes
Afastar cortitnas
Abrir janelas
Arejar ambientes
Jogar fora tudo que não presta
Ou não nos serve

Inundar de luz os sentimentos
E as preciosas lembranças
De uma história
Tão longa
Tão presente

Resgatar sonhos arquivados
Vontades latentes
Dar fôlego a um amor
Que como qualquer outro amor
Precisa ser alimentado
Receber direto na boca
O sopro que revitaliza os carentes

Nunca esquecer
De na calçada
Andar lado a lado
E ao atravessar a rua
Oferecer o braço

7.3.13

Nossas colossais pequenas diferenças



Só são com bom humor encaradas
Porque no dia-à-dia
Não partilhamos cama e companhia

Nossas escovas não se encontram sobre a pia
Não dividimos as mágoas
Nem o café da manhã na mesa da cozinha

Nossas estradas são pistas paralelas
Confluentes apenas no infinito
Ponto que jamais será atingido

6.3.13

Exagero nos cuidados



Sou meio obsessivo
Me dizem
Um pouco possessivo
Mas nem tanto
Ciumento com direitos
Isto é um fato
Violento às vezes
Muito raramente
E qualquer coisa que faça
Está sempre pautada num enorme carinho

Quero saber quem és de verdade
E tudo que envolve o teu mundo
Acompanhar teus passos
Teus hábitos
Separar tua roupa
Admirar-te nos saltos
Constatar se vais
Aonde dizes ir
Saber se estás no escritório
Logo depois de casa sair
Se de fato vês
As amigas que alegas ter
Cheirar-te inteira
Quando chegas
Examinar tua bolsa
Ver se ainda está lá meu retrato
Te dar comida na boca
Garantir que comes o que preparo
Saber se são para mim
As lágrimas que em silêncio derramas
Se são sinceros
Os sorrisos raros que me diriges
Ajudar-te na maquilagem
Para ocultar as marcas em tua face
Velar teu sono o tempo todo
Sem nem ao menos cochilar
Não precisar trancar-te em casa
Sabendo que não mais fugirás

Saber se há em tua vida um outro ser
Disposto a te amar mais do que eu
Alguém que daria um braço
O até mesmo a vida
Só para poupar-te de sofrer
Só para ser aceito por você
E se esta pessoa de fato existir
Tal situação não suportarei
Reunirei armas
Numa guerra sem tréguas entrarei
Batalhas duríssimas travarei
E com o corpo lavado em sangue
A cabeça do inimigo espetada em minha lança
Para ti retornarei triunfante

5.3.13

Brigo



Esperneio
Vicifero
Magoo
Me arrependo
Mas na madrugada
Sempre volto pra você

Ano após ano
Somando calores
Misturando humores
Revisitando superfícies
E o aconchego de nossas profundidades

E assim pactuados
Num silêncio precioso
Pisando em núvens
Retornamos juntos
Ao mundo dos sonhos
A melhor das realidades

4.3.13

Depois das chamas



Quando a brisa
Espalhar as cinzas

E alguma brasa restar
Sob os escombros

Saberão todos
Que a esperança estará mantida

Que não é de Thanatos
O império

E que Eros
Ainda respira

1.3.13

Não se pode calar o amor que vive



Tente amordaçá-lo
Asfixiá-lo
Prendê-lo num cofre blindado
Tente confiná-lo no passado
Mesmo assim ele respira
Escapa
De algum modo se faz ouvir
E grita

Só se pode calar o amor
Quando por decepção se esgota
Assim morre de verdade
Não ressuscita
E o cadáver
Precisa ser recolhido e sepultado
(Rápido)
Antes que apodreça na mágoa
Vala comum dos desesperançados