31.7.14

Terei que me afastar de ti



Sei que é duro admitir
Mas ao brilhar sozinha no céu
Fica fácil para uma estrela
Se fazer notar

Te deixarei sim
Pois ficando junto
Mais atrapalho
Do que ajudo

E embora pareça absurdo
Para te libertar
Precisarei mais e mais
Me aproximar

Circular em tua órbita
Ganhar impulso
E no espaço infinito me lançar
Saindo de vez do teu mundo

30.7.14

Acabou



Mas não foi o fim do sentimento
O que se esgotou
Foi a última chance
Que deram a si mesmos

Nunca se viram como culpados
Não duvidaram
De que entre eles
A paixão ainda existia

Apesar das brigas
Injustiças
Egoísmos
E ciúmes desmedidos

Esforços cegos e incontidos
Que aos poucos apontaram a saída
Para não tornar o amor
Este frágil recém-nascido
Numa inocente vítima

29.7.14

Seja bem-vindo



É o que se lê no tapete
Ao pé da nossa porta

Que ironia do destino
Saber que isso não mais importa

Pois voltar pra casa
Desde que foste embora

De todas as tarefas
Tornou-se a mais dolorosa

28.7.14

Na beira do lago



Sentimento molhado
Horas a fio
Lembrando daquela
Que um dia partiu

Com todo o universo
Nos olhos cercado
Tendo na água
O que a vida roubou

Até que uma pedra
Que nunca soube quem atirou
Desfaz a imagem
E outra vez o amor me escapou

O tempo passou
E aquele espelho
De cristal delicado
Nunca mais sossegou

Desde então
Com o coração apertado
Mantenho os pés parados
E sempre encharcados

Espero o dia
Em que teu sorriso
Na lâmina
Volte a ficar estampado

E desta vez
Já tendo aprendido
E sem ser surpreendido
Respiro fundo

Mergulho, te agarro
E não importa para que mundo
Iremos juntos, estou preparado

25.7.14

Mais uma semana que termina



E a palavra elaborada
Sentida
Se esvazia e evapora

Nada muda
Tudo fica

Sonhos que insistem
Em galopar
Ilusões descabidas

Um cavalgar cego
Por áreas fronteiriças

Cair e rolar
Sobre uma cerca viva
Não poder tirar os espinhos

E aceitar de vez
Que viver assim é destino

24.7.14

Fantasmas não ameaçam o incauto



Enquanto estiverem acesas
As luzes do quarto

Mas para evitar pesadelos
Antes de apagá-las

É bom dar uma boa olhada
Em baixo da cama

Manter a porta destrancada
E o corredor iluminado

23.7.14

Um dia depois do outro



Quero agora
Viver a vida assim

Não tenho mais que aceitá-la
Empurrada ao meu encontro

Toda de uma vez
Como se hoje fosse o fim

22.7.14

Se é para doer que doa



Mesmo que seja desesperador
Como numa abstinência

Amargo
Como um medicamento

Desagradável
Como uma cirurgia

Chato
Como um tratamento

Que o isolamento
Te sirva para alguma coisa

Que não tenham sido em vão
Os bons momentos

E o tempo que tivemos juntos
Não tenha sido à toa

21.7.14

Lara, laiara, laiááá, lara, laiara, laiááá...



Se em minha casa
Quiseres entrar

Em meu sofá
Deverás se sentar

E da minha comida
Terás que comer

Mas para que em minha cama
Possas sambar

Não te iludas, mulher
Meu coração precisas ganhar

E no teu caso, lamento
Ainda tens muito que entender

Espero que aceites
Este meu jeito de pensar

É que se não houver amor
Nada me fará sambar

E sem meus sambas
Não tenho como contigo viver

18.7.14

Minha Dona



Sou cativo de tua boca
Cartógrafo dos teus relevos

Guardião de tuas portas
Vassalo dos teus desejos

Agasalho de tua carne
Serviçal do teu cio

Mais uma vítima de teus feitiços
Marionete dos teus caprichos

Touro marcado com tua insígnia
Um livro qualquer no teu acervo

A sobremesa que exiges bem servida
Escravo liberto preso ao teu leito

O último gozo antes da partida
O perfume que resta no travesseiro

Mas de nada me queixo
Pois feliz recebo corpo e sentimento

Me permites o uso, o abuso
Sou conduzido e conduzo

Lambuzo, sacio
Derrubo do púlpito e sou saciado

Até que rendido, quase morto
Desfaleço com olhar paralisado

Vendo teias de aranha
No teto branco do quarto

Já ouvindo lá fora o movimento dos pássaros
Enquanto velo o teu sono

Sem saber ao certo
Se foi sonho ou fato

17.7.14

Tanka inspiration 7



O inverno chegou
E o bando reunido
Outro sol buscou
Toda a chance teve o frágil
Mas ninguém o carregou

16.7.14

Só tem como encontrar



Quem um dia procurou

Só tem como escolher
Quem um dia achou

Só tem como responder
Quem um dia perguntou

15.7.14

Amor



Maior dos patrimônios
Não trocaria por uma casa enorme
Ilha, avião ou carro novo

Vale mais que uma fábrica
E até chocolate suíço
Não é tão gostoso

Não se pode achar
Em qualquer banco de praça
E para ser mantido vivo exige esforço

Mas mesmo que eu fosse dono
De tudo que a vista alcança
Viver sem amor seria no mínimo tedioso

14.7.14

Não esperaste nem um pouco



Além do tempo combinado
Foste embora

É que o amor pode atrasar
Mesmo quando marca hora

Está arriscado a transformar
Promessa em estória

Fica sujeito a ser fisgado
Por outro rabo de saia

Pois não tem bitola nas vistas
Nem o coração numa mala

E como saber em que chão
Vai construir sua morada

Se não puder experimentar
Champignon, sushi e rabada?

Sei que isso não é desculpa
É só explicação

Mas bastava só mais um tempinho
E a esta hora seríamos só paixão

11.7.14

Olhando pela janela



Soprando o meu café
Ainda confusa e entorpecida
Com o impacto da luz que principia
Reparo num bilhete
Deixado delicadamente
Junto ao jornal do dia:

“Tive que partir
Mas deixo sob o travesseiro
Num envelope lacrado com lágrimas
Um poema ditado pela paixão
Fruto inevitável desse sentimento
Para que tudo que foi compartilhado
Fique eternamente registrado
E possa ser lembrado
Nos momentos de solidão”

Com o peito apertado
E a saudade já fazendo seu trabalho
Li num só fôlego
Procurando conforto
Aqueles versos arranjados com tanto carinho
Que em resumo mais ou menos diziam:

“Não te entristeças tanto
Quando pela manhã acordares
Com metade da cama vazia
Se aquele que até há pouco
Estava em teus braços
Partiu em silêncio
Na madrugada fria
Foi para evitar embaraços
E garantir teu repouso

Mais triste é aquela
Que na enfadonha rotina
Não colecionou memórias do amor
Foi privada de suas maravilhas
E não tem como acreditar
Que frágeis bolhas de sabão
Durem toda a vida
Por mais perfeitas e coloridas
Que possam ser suas elaboradas fantasias”

10.7.14

Quem vê



Uma taça de vinho
Pela metade

É tentado a pensar
Sobre o que faltou

Mas se olhada
Com menos brevidade

Pode revelar
O que já foi bebido

E imaginar
Quanto prazer gerou

8.7.14

É sempre bom lembrar



Que um dia
Precisaras cuidar
De quem sempre cuidou

E justamente por isso
A receber cuidados
Não se acostumou

7.7.14

Sinto frio neste momento



Um frio triste e profundo
Que não respeita barreiras
Dribla as defesas
Percorre a espinha
E assusta os pensamentos

Frio que me prega no leito
Que se incomoda com a luz do dia
Se insinuando pela veneziana
E que sufoca a chance de uma saída
Ao confinar-me nesta gaiola escurecida

É diferente daquele frio leve e gostoso
Que antes do clarear
Me corre pela superfície do corpo
Estimula a levantar
E a encarar o dia com gosto

Após uma noite de sono
De profundo repouso
Com o corpo ainda aquecido
E continuando a misturar por um tempo
Sentimentos com lembranças e sonhos

4.7.14

O amor só é capaz de salvar



Aquele que cruza o deserto
Resiste à travessia
Alcança o oásis
E mata a sede
Bebendo de sua água cristalina

3.7.14

De propósito



Exageraste no vermelho
E te esfregaste de batom

Na tela vazia do meu corpo
Gravando teus desejos

Em frases que ressentem
A morango e pêssego

Trilho viscoso
Que desperta a fome

Rabiscos cifrados
Grafites tensos

De veneno raro
Quase um assassinato

Espiral lasciva
Hipnótica e centrípeta

Que desemboca
No centro de minha boca

Que te suga
Úmida e sedenta

E busca
O gozo ofídico recíproco

Êxtase louco
Onírico e peçonhento

Insólito enlace
Em que desaparecem

Tempo
Espaço

E ficamos enclausurados
No mundo subaquático

Mágico instante
Em que se pode desprezar a chegada

E aproveitar a viagem
Torna-se o mais importante

2.7.14

A cômoda conveniência



Sufoca as vontades
Mata a espontaneidade
Restringe a visão

O imobilismo vazio
Transforma o indivíduo
Num autômato sem noção

E isso se torna ainda mais triste
Quando acontece
Antes da sua maturação

Sem que tenha a oportunidade
De decidir por si mesmo
E lhe escape a chance da solução

Aí é que a vida perde a graça
E não raro a criatura se vê tomada
Por uma tristeza de difícil compreensão

Ela não se coloca na frente de um espelho
Foge de qualquer questionamento
Não sabe buscar a própria libertação

Teme sofrer mais com a vida de outra forma
Opta pelo que aos outros não incomoda
Mas funciona independente da razão

1.7.14

Te apartas de mim



Antes que o pior
Venha a nos acontecer

Se não me queres
Como quero que me queiras

Vai-te embora
Libera o caminho de vez

Pois só tenho
Esta vida pra querer

E até o fim
Ela deverá ser inteira