29.5.09
29509
Eis-me aqui
Na 49ª hora
Surpreso
Por ser um privilegiado
Feliz
Por amar
Ser amado
E não ter data marcada para ir embora
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Faço mais uma pausa
Para poder voltar
Assim que a cabeça
De forma segura reorganizar
Beijos
28.5.09
Absens
(para o meu pai)
Já são vinte e um anos
E ainda me dói ver na sala a poltrona vazia
Com os braços pelo tempo lustrados
E o teu contorno no assento marcado
Alguns pequenos furos causados pelas brasas
Que por anos voaram vez ou outra de teus dedos dormentes
Ficavas ali sentado
Por horas sem fim
Um tempo enorme
Tempo demais
Um olhar distante
Que o próprio tempo parecia atravessar
Eu te observava à distância
Sem entender o que via
E sem coragem de perguntar
Imaginava o mundo em que estavas
Tua figura seria e fechada
Despertava em mim estranhos sentimentos
Um misto de receio
Mistério e encantamento
Só lamento não ter tido à época
Uma vaga ideia da tua importância
E do vazio enorme que a tua ausência causa
Se pudesse voltar o tempo
Faria o não feito
Me achegaria de ti
Te daria um abraço forte
E não te largaria
Nem mesmo se me pedisses
Te falaria de mim
De minha vida
Meus anseios
Sonhos
Medos
Tentaria te ouvir
E entender
Ao menos um pouquinho
Antes de
Por fim
Irremediavelmente
Te perder
Não te deixaria tão sozinho
A espera da morte
27.5.09
26.5.09
Nas noites sem lua
(para Cecília Meireles)
Recolhia vagalumes no campo
Para que iluminassem o nosso caminho
Prendia-os num vidro claro
Com furos na tampa
E o amarrava na ponta de uma vara
Como um verdadeiro farol
Corríamos pelos pastos
Atravessando cercas e riachos
E depois cansados
Num ponto qualquer nos sentávamos
Abria o frasco
Com cuidado
E sem deixá-los escapar
Uns nos outros
Um a um
Os esfregávamos nos braços
Dorso
Costas
Pernas
Face
Aos poucos íamos nos transformando
Seres luminescentes
Peixes abissais
Pistas de aeroportos
Estrelas cadentes
Galáxias
Nos alternávamos criando estórias
Hoje
Essas lembranças
Me causam uma saudade imensa
De um tempo em que a fantasia era tudo
E nos bastava
25.5.09
Abre-te sésamo
Minha antiga vila não mais existe
Desapareceram as colinas vermelhas
E os pés sujos de lama
As ladeiras que serpenteavam antigos casarões
Hoje se insinuam entre canyons edificados
Ladrões de horizontes e montanhas
Sumiram as pedreiras cinzentas
Para onde os meninos iam depois da escola
Tardes inteiras saltando de rocha em rocha
Garimpando nas frestas
Coloridas pedras
Com os bolsos quase rotos
Repletos de cristais
Corríamos todos para depositá-las em pequenas caixas
Ficávamos lá extasiados
Admirados com a nossa fortuna
O mais precioso tesouro que se pudesse ter
Éramos todos Ali Babas
22.5.09
21.5.09
Salvatério
20.5.09
Não sou mais o mesmo
19.5.09
Geminiano (dizem que) sou
(desenho de Biba Rigo)
E não há como esconder
As características
Tenho-as todas
Sendo assim
Me sinto confuso
Tendo que aceitar ser dois
Como se não bastasse
O tormento de um
Anjo num ombro
Demônio no outro
Sem polícia ou tribunal
Decisões arrancadas a fórceps
Conflitos e ressentimnos arrastados
Por acalorados embates
Onde não faltam sangue e golpes baixos
Para vencer tudo vale
Quando um fala
O outro não se cala
Tenta manter a rédea
Semeando a dúvida
Logo eu
Vivento este tumulto
E nem mesmo em astrologia
Acreditamos
18.5.09
15.5.09
A casa mais feia de minha rua
Não é a menor nem a mais simples
Também não é a do casal de velhos
Com o filho maluco
Em contínuo surto
E o muro caído
Não é a da turca maníaca
De mal com a vida
Que sem ter com o que se ocupar
Vigia a vizinhança
E se sente dona do lugar
Nem é a do japonês atlético
Cumpridor de uma disciplina samurai
Que leva seu rothweiler para defecar
Em frente aos portões alheios
Antes da primeira ginástica do dia e após a segunda
Também não é a casa da frente
Que perdeu a fachada graciosa
Desfigurada pela última reforma
Não é a do casal do lado
Cujo rapaz numa noite fria
Durante uma briga
Saiu para a rua pelado
E se postou a chorar sentado na guia
Até atender aos insistentes chamados da amante
E retornar para dentro
Cabisbaixo e soluçante
Nem a casa do lado oposto
Onde uma família de chineses
Não para de crescer
Visivelmente enriquecer
E de formar um país à parte
Também não é a dos irmãos gêmeos
Que já além dos trinta
Se comportam como meninos
Madrugada adentro
Batendo bola na rua
Monotonamente
De um para o outro
Do outro para o um
Já com suas respeitosas panças
Cigarrinho no canto da boca
Camisa do time
E lata de cerveja na mão
Não é a do outro casal de velhos
Que mal caminham ou enxergam
Mas insistem e andar em seu próprio carro
No qual não conseguem entrar ou sair sozinhos
Sempre esbarrando em muros e portões por onde passam
E afugentando a todos em seu caminho
Nem é a da senhora triste
Esposa de um militar de patente
Que fora nunca trabalhou
E se distrai saindo para varrer a calçada
Duas vezes por dia
Para mantê-la a mais limpa da rua
E olhar o movimento
Também não é a do casal de dentistas
Cuja empregada ao final da jornada
De cabelo molhado e alfazema
Se posta no portão da frente
Para uma prosa nordestina lenta
Com o guarda do dia solitário e carente
A casa mais feia da minha rua
Enfeia a paisagem
Foi enfeiada pelo medo
Enfeiou-se por fora
Por ser feia por dentro
Grades
Sobre muros
Sobre câmeras
Sobre holofotes
Sobre choques
É fruto da paranóia que gera o aprisionamento
Que faz dos espaços passagem
Selva sem vida
Guerrilha e abandono
Isolamento
Que nos tira o envolvimento
E mata aos poucos a cidade
14.5.09
Adoro rosas
13.5.09
Continuamos nossa conversa
Do ponto em que paramos
Decorridos vinte e cinco anos
É como se nunca nos tivéssemos interrompido
Palavras e sentimentos
Outrora tão ousados
Impulsivos
Continuam intensos
Vivos
Mormaço e torpor foram quebrados
Minhas artérias há muito colabadas
Receberam um súbito sopro
Devolveram vida aos territórios
De superfícies craqueladas
E nós aqui
Outra vez frente a frente
Agora como sobreviventes
Desatando amarras
Reduzindo lastros
Teríamos mantido igual sentimento
Se juntos
Por tanto tempo tivéssemos permanecido?
Não me importa a dúvida
O fato é que me sinto vivo
E ter de novo esta certeza
Traz de volta um alívio
Um prazer de dever cumprido
12.5.09
Um riacho
11.5.09
Metamorfismo
8.5.09
Não haverá outro lugar
(para Torquato Neto)
O mar é o segundo céu
O céu é o segundo mar
Somos o recheio
A fase instável
Deste imenso sandwich
Os seres que num vivem
O outro não podem habitar
E nós aspirantes
Nefelibatas aquáticos
Não somos de lá nem de acolá
Um dia
Se abrirá uma boca imensa
E a tudo que existe sorverá
Naturezas se transformarão
E quem sabe
Sobrevivamos alguns no que restar
7.5.09
Forja
6.5.09
5.5.09
4.5.09
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