9.9.16
Para mim
Não existe lugar mais triste no mundo
Do que um brechó, essas lojas de usados
Não sei bem por que, mas sempre penso o pior
Penso que o vestido de noiva
Garbosamente exposto na vitrine
Seria para um casamento que não aconteceu
Que as roupinhas de bebê
Cuidadosamente empilhadas sobre o balcão
Vestiriam o fruto de um amor que não nasceu
Que o paletó empoeirado
Com um lenço delicadamente dobrado e esquecido no bolso
Foi de alguém que nem por seus antigos pertences será lembrado
Que as blusas desfiadas, calças brilhando nos fundilhos
Camisas faltando botões e com os colarinhos puídos
Não deveriam ser vendidas mas sim doadas para quem mais precisa
Que os calçados, bolsas, cintos, sempre muito usados
Sinto-os carregados demais em histórias
Quando os tenho nas mãos, acho-os muito pesados
Que os relógios, brincos, colares, pulseiras
Estão à espera de novos pulsos, pescoços e orelhas
Que possam resgatá-los do ostracismo lhes devolver o brilho
Que os livros, discos e filmes misturados nas estantes
Preferências e universos culturais tão contrastantes
Viraram uns poucos trocados para garantir algum alimento no prato
Que as paisagens e retratos pintados por mãos nitidamente amadoras
E que tristemente disputam espaço nas paredes
Já serviram para alegrar os mais diversos ambientes
Que as fotos antigas, famílias imensas reunidas
Exercem um estranho fascínio sobre uma pessoa
Que se interessa em colecionar mortos que não são seus
Que as cartas escritas de diversas partes do planeta
Postais com selos raros e souvenires trazidos dos lugares mais exóticos
Não tem qualquer significado para quem os vê assim reunidos numa caixa de sapatos
Que a louça manchada, as taças lascadas, a prataria torta e oxidada
Precisariam de um bom restauro
Para terem ainda alguma serventia numa refeição em família
Que os móveis imensos, eletrodomésticos complexos
Alguns intactos outros nitidamente desgastados
Vieram de lares desfeitos e tornaram-se inúteis para seres solitários
Que quando passando por uma rua tranquila se vê uma faixa: Família vende tudo!
Não é triste pensar que tudo que foi juntado por tantas vidas em tantas décadas perdeu o sentido?
E que até a casa até vai junto podendo desaparecer desse mundo?
É assim que raciocino
Sei que é exagero, mas é inevitável
Minha mulher não se incomoda com isso e pensa mesmo tudo ao contrario
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