31.5.11
Nesta noite
Sem seu corpo geminado
Minha temperatura baixou
Vesti pijama e meias
Aumentei cobertas
Fechei portas e janelas
Vedei frestas
Mas nada adiantou
Dormi congelado
O pai carrega o filho
No carro
Em disparada
Bêbado
Assutado
Avança pela noite
Encharcada
Não enxerga o asfalto
Já não percebe mais nada
30.5.11
Abriste meu peito
Cortando bem no centro
Com um serrote
Disseste que era só para ver
Se tinha algo lá dentro
Acreditei
Dei sorte
Moleque
Lá no interior
Aprende a escrever mijando
A nadar matando aula
A gostar das coisas espiando
A correr roubando fruta
A a competir cuspindo
A suportar a dor se machucando
A resolver diferenças encarando
Aprende na rua a viver num mundo
(Até certo ponto) Mais humano
Como fizera seu pai antes dele
E agora vive lhe recriminando
27.5.11
Tanka inspiration 3
Junto ao espelho d'água
Dando de comer às carpas
O silêncio cessa
Com o som grave dos peixes
Com pressa em sorver migalhas
Dando de comer às carpas
O silêncio cessa
Com o som grave dos peixes
Com pressa em sorver migalhas
26.5.11
25.5.11
20.5.11
19.5.11
É de tão pouco que preciso
Basta que:
Me dê um sorriso
E me achego
Fale manso comigo
E me derreto
Me dê um abraço
E me abrigo
Não me mande embora
Aí eu fico
18.5.11
A colossal geleira
Em tempos de aquecimento
Com força suprema
Se precipita sobre o oceano
Em blocos imensos
Numa sequência de estrondos
Flutuam por um tempo
Mas sucumbem ao poder do líquido
Fundindo-se a este novo meio
Que de bom grado
Lentamente os vai recebendo
O repique da pedra
Na superfície do lago
Por um instante
Faz igualarem-se as substâncias
E como sólido
O líquido se comporta
Mas a farsa é logo quebrada
Sem prévio aviso
Ele a abraça
Deglute
E para o fundo a pedra é levada
Aumenta assim a sua coleção
Em mais uma peça
Em seguida se posta com a mesma atitude serena
A espera da próxima vítima
Lançada de sua margem como brincadeira
17.5.11
16.5.11
Me interessa mais
Juntar as peças
Construir um mundo novo
E arriscar seu funcionamento
Que comprar miniaturas prontas
E mantê-las na estante
Como meros ornamentos
13.5.11
Tanka inspiration 2
Numerar estrelas
Negar-lhes identidades
Que sentido faz?
Há suficientes nomes
Para tantas entidades?
11.5.11
Lá do alto
Das torres e portais
Santos e anjos
(Alguns até bastante mutilados)
Com seus corações de pedra
Olhos de pedra
E pés chumbados
Despejam sobre o mundo
Seus semblantes de sofrimento e rancor
Que nem mesmo os séculos conseguiram atenuar
9.5.11
Uma infinidade de gestos
Expressam diferentes mensagens
A mão fala por si
É quase um ser completo
A depender da posição
Desenho e movimento
Passa uma impressão
Um comando
Um sentimento
Chama
Expulsa
Acalma
Intimida
Incita
Ofende
Indaga
Recusa
Acolhe
Bloqueia
Referenda
Delimita
Apoia
Aponta
Reúne
Dimensiona
Reparte
Cobra
6.5.11
Amor demais
É farol alto em noite escura
Que numa ultrapassagem proibida
Vem em sentido contrário
Ofusca a visão
Nos tira da pista
Pois não há marcas no chão
E faz com que batamos de frente
No primeiro desavisado que nos encontra na contramão
São sempre muitas as vítimas
Quanto mais verdade
A palavra carrega
Mais pesa
Há palavras que quando caem
De tão pesadas fazem os seres desaparecer
Se fincam no solo como monólitos
Desde sempre a ele soldadas
Há alguém do outro lado do espelho
E esta pessoa não reconheço
Em mim desperta
Não mais que estranhamento
Desconstruo sua face marmórea
Com um único murro
E procuro nos fragmentos
Tingidos de vermelho
Identificar pistas
Que me levem a mim mesmo
Tentar recombinar o que não entendo
E recuperar algum sentido para o que vejo
É o que me resta no momento
3.5.11
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