3.9.14

Pouco antes do fim



Ainda se riam com gosto
E comentavam com frequência
Daquele saboroso dia em que se conheceram

Lembravam que nunca se apresentaram direito
E nem mesmo se repararam muito
Naquele festivo momento

Almas gêmeas e ingênuas
Não imaginaram que se pertenceriam
Tão completamente e por tanto tempo

Que suas vidas se entrelaçariam
Ao ponto de confundirem as histórias
E completarem-se nas falas e pensamentos

Que se vestiriam tão bem com seus corpos
Que prefeririam os mesmos países
Vinhos e sonetos

Que celebrariam juntos as vitórias
As conquistas, a penca de filhos
E o recíproco crescimento

Mas como tudo na vida
Nada está seguro
E isento de arrefecimento

O tempo passou e fez sentir seu efeito
E o que era mágico ele não matou
Mas o vermelho vivo opacificou

Foram aumentando os momentos
Em que se perdiam um do outro
E surgiu um inédito distanciamento

Passaram a sentir um leve estranhamento
O tom dos diálogos ficava mais confuso
A necessidade de detalhar explicações ia crescendo

Fechavam-se em divagações silenciosas
Não ouviam mais as mesmas músicas
E passaram a se tocar apenas com as costas no leito

Começaram a brigar por motivos tolos
Firmavam posições duras demais
Sem a possibilidade de mudanças no entendimento

Suas rotinas não mais coincidiam tanto
Os momentos juntos à mesa rareavam
E uma inédita tristeza passou a ser respirada

Antes que a vítima fosse o respeito
Tentaram resgatar a plenitude do envolvimento
Mas de comum acordo viram o fim do relacionamento

Um fim compreendido e maduro
E como quase tudo nesta história
Perfeito

Não foram necessárias palavras pesadas
Ambos perceberam
E julgaram que era o melhor a ser feito

Pois este fim lhes devolveria a si mesmos
E como sempre acontece com tudo que acaba
Obriga a pessoa a um inevitável recomeço

E hoje, depois de muitos acontecimentos
Em que trilharam caminhos distintos
Se veem em paz neste novo momento

Construíram uma relação mais leve
Ainda permeada de amor
Mas em outras bases, de outro jeito

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